No rescaldo dos incêndios de 2003, o Governo fez promessas de que iria investir em meios de prevenção e de combate a uma calamidade que vai consumindo a floresta portuguesa e o património de numerosas famílias. Mas as boas intenções anunciadas quando as chamas ainda alastravam pelo país perderam-se nos labirintos burocráticos da administração pública. Adiadas ou simplesmente esquecidas, numa espiral de irresponsabilidade cujos resultados estão novamente à vista.
Em menos de sete meses, a área ardida em Portugal durante este ano já ultrapassou os números que se verificaram em igual período de 2003, pesadelo que, pela sua invulgar dimensão, parece ter convencido as autoridades de que não se repetiria. O desaparecimento de uma parte da reserva natural da Serra da Arrábida ou a voracidade insaciável das chamas na região do Algarve, perante a impotência de bombeiros e populações, são novamente o espectáculo desolador da realidade de um país que ainda há pouco tempo era desafiado, por causa das conquistas no plano desportivo, a sacudir a sua descrença e a melhorar a respectiva auto-estima.
A crua verdade é que a Agência para a Prevenção de Incêndios Florestais, ideia lançada pelo anterior ministro da Agricultura, Sevinate Pinto, não passa de uma ficção. Liderada pelo actual secretário de Estado das Florestas, a sua primeira reunião só se realizou em Junho passado. Mesmo a tempo de os seus responsáveis assistirem à chegada de uma nova onda de destruição maciça que avança sem resistência perante as mesmas carências de sempre: falta de equipamentos e de meios financeiros e humanos, ineficácia na prevenção e inabilidade para forçar os proprietários a procederem a tarefas tão essenciais como a limpeza das matas.
A incapacidade para definir prioridades que não estejam sujeitas aos critérios arbitrários decorrentes da força dos "lobbies" é um dos sinais de subdesenvolvimento de um Estado simultaneamente pesado e fraco. O contraste entre a inexistência de recursos para aplicar no combate aos fogos e a generosidade dos cofres públicos para construir estruturas sumptuosas destinadas à realização de um evento desportivo efémero, transmitem a imagem de um país patético, apostado em melhorar as aparências enquanto varre o resto para debaixo do tapete. E, ano após ano, vão-se os dedos embora fiquem alguns anéis.
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