domingo, fevereiro 29, 2004

PENACOVA – Fim-de-semana em Penacova com um gostinho a lampreia.........

Banhado pelo Rio Mondego que lhe levava a lampreia, o concelho de Penacova desenvolveu um dos pratos mais procurados na região

Penacova aposta forte na festa da lampreia. Durante este fim-de-semana – sexta, sábado e domingo – nove restaurantes do concelho mostram o que valem e dão a provar o tradicional arroz de lampreia, entre outros pratos deliciosos. Uma oportunidade para conhecer a gastronomia, o artesanato e as belas paisagens que o concelho tem para oferecer.

Hoje tem início o sétimo fim-de-semana da lampreia em Penacova. Organizado pela Câmara Municipal, o certame pretende promover a gastronomia local através de um dos pratos mais conhecidos e tradicionais da região, o arroz de lampreia.
À semelhança das edições anteriores, o certame decorre em nove restaurantes do concelho, que vão praticar preços convidativos: 55 euros a lampreia e 15 euros a dose. Quem se deslocar a Penacova este fim-de-semana, para além de saborear este prato, tem direito à oferta de doces conventuais regionais – como são as nevadas e os pastéis de Lorvão – e à água, cedida pela Águas das Caldas de Penacova. Haverá também artesãos locais a trabalhar ao vivo nos restaurantes, a manufacturar palitos, moinhos de vento, barcas serranas. O apreciador também vai ter oportunidade de ganhar, através de sorteio, uma dormida no Hotel Palacete do Mondego ou quatro dormidas nas três casas de turismo rural do concelho: Nascer do Sol (Vale Carvalho), Casa das Oliveiras (Vila Nova) e Casa de Turismo Rural da Carvoeira.
Nas edições anteriores, o fim-de-semana resumia-se a dois dias, sábado e domingo. “Este ano os restaurantes fizeram pressão e disseram que se justificava fazer durante três dias”, explica António Simões, vice-presidente da Câmara Municipal de Penacova, pelo que se adicionou a sexta-feira.
“Temos um conjunto de muito bons restaurantes no concelho e nesta época Penacova é o destino privilegiado para a lampreia. Para eles (restaurantes) é uma mais-valia toda esta promoção turística para o concelho”, afirma António Simões. Segundo o responsável, é importante que haja uma interacção grande entre todos os intervenientes, envolvendo a autarquia, restaurantes, hotelaria, as águas, os artesãos. “O objectivo é envolver não só as pessoas que possam ter uma mais-valia para a sua actividade, mas também a população do concelho, de forma a criar uma auto-estima para os penacovenses e uma empatia com as pessoas que vêm de fora. Para que as pessoas sintam isto como seu”, afirma.
A Câmara Municipal tem apostado na promoção do certame através da comunicação social e num conjunto de iniciativas paralelas, como é o caso de duas exposições de pintores do concelho (de Frutuoso Oliveira no átrio da Câmara e de José da Fonte na Biblioteca) e de uma ludoteca itinerante onde as crianças podem permanecer durante o dia. A aliar a isto, há as paisagens naturais que Penacova tem para oferecer. “As pessoas que vêm ficam a gostar de Penacova, que tem uma paisagem muito agradável”, garante o vice-presidente, que sublinha que quem gostar de aventuras tem disponíveis equipamentos para a prática de rappel, slide, tiro com arco e canoagem, na praia fluvial do Reconquinho.
A “fama” do certame já ganhou alguma dimensão. “Quem vem normalmente gosta de voltar. O ano passado, veio um casal de Lisboa de propósito para almoçar lampreia e depois voltou de taxi. Outros quase que deixam marcado nos restaurantes de um ano para o outro”, conta António Simões, referindo que as pessoas vêm de todo o lado, muitos do Norte e também de Lisboa.
Nas últimas edições a afluência tem sido de “milhares de pessoas”. “De ano para ano tem sido melhor, tanto que este ano passámos para três dias para que o tempo do evento seja maior”, assim como a afluência do público.

VOLTADA PARA O TURISMO

Penacova está em condições de dar um salto qualitativo, afirma o vice-presidente da Câmara Municipal. Apesar de alguns constrangimentos, que têm que ver com a estrutura do concelho e o terreno acidentado, o responsável considera que as grandes obras estruturais do concelho do pós 25 de Abril estão resolvidas e que o caminho a tomar é apostar no turismo.
“As estradas estão muito melhores, não só no acesso pelo IP3 mas nas outras vias do concelho”, refere António Simões, sublinhando que foi criado um conjunto de infra-estruturas “viradas para a qualidade de vida das pessoas”, como o hotel, as casas de turismo rural, as piscinas municipais, a água ao domicílio em todo o concelho. “Eu julgo que o turismo é o futuro das autarquias. Penacova tem potencialidade para aproveitar o que a natureza lhe deu”, refere o responsável, nomeando a praia fluvial do Reconquinho e o Rio Alva. E acrescenta que Penacova “tem que se afirmar pela qualidade”, dado que não tem grandes tradições em termos industriais, em virtude da proximidade com Coimbra.
Em busca dessa qualidade, a autarquia fez um conjunto de investimentos nesta área, com a melhoria de espaços públicos, reconstrução dos moinhos, reabilitação do Mosteiro do Lorvão. Há também a ambição de fazer uma exposição permanente na Casa do Monte em Lorvão.
Mas outros projectos estão na forja. António Simões reconhece estar “esperançado” no avanço da construção do novo Palácio da Justiça.
A Câmara cedeu o projecto e o terreno, e espera agora o desenrolar do processo “a curto prazo”. A constrição do novo tribunal viria libertar o actual edifício no centro da vila, onde a Câmara quer instalar a Casa da Cultura. “Temos um conjunto de artistas em Penacova que não têm um espaço próprio para expôr a suas obras. Os nossos artistas merecem ter um espaço que possa ser proporcional à sua qualidade”, refere António Simões. Projectada está também uma nova biblioteca a ser construída na zona junto às escolas, visto que a existente já não preenche todos os requisitos.
Sendo o concelho contemplado com uma grande riqueza natural, a autarquia tem vindo a apostar na sensibilização ambiental. Está a promover um projecto de educação ambiental em todas as escolas do concelho, para além de, até dia 31 de Maio, decorreram dois concursos: um de poesia intitulado “Água, fonte de vida, fonte de inspiração” e um de fotografia sobre o tema “Um olhar sobre o património do concelho”.

Escada de peixe
é fundamental

O projecto da construção de uma escada de peixe na Ponte Açude em Coimbra é uma reivindicação de há muitos anos da Câmara Municipal de Penacova. Em causa está a subida do rio Mondego pela lampreia que já chega em escassa quantidade a Penacova, ao contrário do que acontecia antigamente, antes da existência da Ponte Açude, que constitui um obstáculo aos peixes desta espécie que sobem o rio, não conseguindo atravessá-lo.
Actualmente a quantidade da lampreia em Penacova difere conforme seja um ano de muita pluviosidade ou não. Quando o leito do rio vai cheio, os peixes conseguem passar o obstáculo e subir o rio. “Há dois anos quando houve as inundações houve muita lampreia em Penacova, mas nos outros anos já não foi assim”, recorda António Simões, vice-presidente da Câmara Municipal.
Esta realidade torna a construção do que se convencionou chamar “escada de peixe” muito importante para a continuação da pesca da lampreia no concelho. Actualmente existem apenas três pescadores com licença profissional no concelho a pescar lampreia.
“O que queríamos é que não tivesse aquele obstáculo natural. Corremos o risco da lampreia no Mondego se tornar uma espécie em vias de extinção”, diz o responsável.
Entretanto a Câmara Municipal de Coimbra já aprovou o projecto para a construção da escada de peixe, trazendo um avanço significativo nas pretensões do executivo penacovense. “Agora do projecto até à prática vamos ver o que demora”, refere.
António Simões considera que a lampreia que é apanhada em Penacova “é mais saborosa porque está mais batida das pedras na água limpa do rio Mondego”. “Quanto mais a montante mais saborosa se torna. Por isso é que a lampreia tem outro sabor cá”, garante.
Paralelamente há outras entidades que estão interessadas em levar adiante a construção da escada de peixe. Manuel Flórido, mordomo-mor da confraria da lampreia, garante que a associação quer ser “mais uma voz” que se vai juntar aos amigos do Rio Mondego e afluentes em relação a este projecto. E vão escrever uma petição, que irá circular este fim-de-semana da lampreia em Penacova, para as pessoas assinarem a favor da construção da escada de peixe. “O objectivo é conseguir quatro mil assinaturas para levar à Assembleia da República e o assunto ser discutido em plenário”, explica Manuel Flórido.

Confraria vai defender
pratos regionais e certificação

A confraria da lampreia deverá ser uma realidade muito em breve. A escritura notarial da confraria foi efectuada em Agosto de 2003 e entretanto foram eleitos os corpos sociais, sendo o mordomo-mor Manuel Flórido, o juiz da confraria Fernando Lopes e o presidente do conselho fiscal Mário Pereira. A comissão instaladora fez o regulamento e o ritual. Espera-se agora que seja feito o primeiro capítulo da confraria da lampreia até meados de Abril, para a tomada de posse dos corpos sociais e entronização dos sócios fundadores.
De acordo com Manuel Flórido, a iniciativa foi de um grupo de amigos que normalmente se juntam a mesa, que conversam sobre alguns temas e que depois resolveram criar a confraria da lampreia.
São 12 os membros fundadores e que também constituem a comissão instaladora. A maior parte são naturais do concelho: Manuel Flórido, Carlos Mendes, Álvaro Pereira, Fernanda Pimentel, Álvaro Pinheiro, Luís Menezes, Carlos Fonseca, Leonel Serra e Manuel Feio, e outros exercem a profissão em Penacova: Fernando Lopes, Fernando Andrade, Mário Pereira.
É intenção da direcção realizar a cerimónia ainda durante a época da lampreia, mas está tudo dependente do processo “burocrático” de manufactura dos trajes e insígnias. “Está a ser muito rápido, devido à urgência que temos”, refere o mordomo-mor.

convÍvio e divulgação

A confraria da lampreia tem como objectivos o convívio e a amizade, e a defesa dos saberes e sabores não só da lampreia – o “prato nobre” – mas também os pratos regionais, como o arroz de míscaros, a chanfana, o peixe frito, os pastéis conventuais do Lorvão e as nevadas, o bacalhau com migas, a sopa seca (que a confraria pretende recuperar) e a gastronomia tradicional. Manuel Flórido refere que a associação está numa fase de investigação acerca da lampreia e já foram encontradas 23 maneiras diferentes de confeccionar lampreia.
Outro dos objectivos da confraria é a solidariedade. Os estatutos determinam que 20 por cento da conta da gerência seja destinada a IPSS’s ligadas à juventude e à terceira idade. Se as receitas não forem suficientes, a direcção já pensou em outras formas de ajudar, como promover jantares para as famílias mais carenciadas, por exemplo.
Há várias iniciativas previstas para decorrerem durante o ano ligadas à lampreia e aos pratos regionais. A realização de fins-de-semana ou domingos gastronómicos para promoção de pratos regionais, um seminário, uma exposição de fotografia e outra de pintura sobre a lampreia.
Manuel Flórido revela outras ambições, como fazer uma rota turística da lampreia a nível nacional (e não só) e conseguir a certificação da receita da lampreia à Penacova, que se caracteriza pela confecção com vinho tinto, entre outros ingredientes específicos.

A indumentária dos confrades

O traje dos membros da confraria da lampreia é composto por um capote tipo varino com mangas e carapuço, revestido com uma rede que simboliza a rede em que os pescadores guardavam a lampreia. O capote era usado por pessoas mais abastadas, nomeadamente os arrais das barcas serranas, que servia de agasalho e também era usado em cerimónias. Como o meio era pobre, a peça de vestuário passava do pai para o filho mais velho.
Tem um chapéu de aba larga como se usava nos finais do século XIX, tanto pelos homens como pelas lavadeiras do Mondego.
O mordomo-mor e o juiz usam uma vara, que antigamente era usada pelos rapazes que iam às romarias, e que tanto servia de adorno como de defesa, com uma lâmina pontiaguda na ponta.
A insígnia tem uma medalha branca e azul, cores inspiradas no brasão do concelho e no azul do mar. As mesmas cores estão presentes no escapulário. O logotipo é composto de uma bateira, uma fisga e uma lampreia.



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